Página Território

Se eu encontrasse o meu bairro na rua...
Depoimento de Jussara Dias (São Mateus, SP)
"Se eu encontrasse o meu bairro na rua, diria que estou de mudança e venho refletindo… como vou andar pela cidade? Meu ponto de partida sempre foi aqui. Mas demorei muito para perceber que não era apenas um ponto de partida – era também um destino.
Hoje, com mais maturidade, consigo enxergar suas potencialidades: a sua história, a sua presença política e principalmente as pessoas que têm e que as mesmas construíram."
Contextualização do depoimento de Jussara Dias
Como parte do último encontro da terceira rodada da oficina realizada na Biblioteca Cassiano Ricardo em 2024, a participante Jussara Dias, psicóloga e moradora de São Mateus, leu seu pequeno texto, desenvolvido a partir do título: Se eu encontrasse meu bairro na rua, eu diria o seguinte...
Para ela, a proposta de escrita foi uma oportunidade de rememorar sua vida no bairro e compreender a mudança para sua nova casa, em outra região.
As palavras de Jussara ecoam uma verdade: o bairro não é só cenário, é personagem. O território pulsa, escuta, transforma e é transformado.
Linha do Tempo: Locais e percursos da oficina
SÃO PAULO | SESI-SP Av. Paulista – 2015
Com esse depoimento, marco aqui o início da página sobre a palavra Território, que traz os locais pelos quais a oficina esteve e a prática de Viewpoints e Composição, que aprendi como ator quando fui aluno de Miriam Rinaldi no Núcleo Experimental de Artes Cênicas do SESI-SP.

Um território em ação
O trabalho da oficina sempre se deu em movimento. A cada edição, deslocamos corpos e escutas para outros pontos dos Centros Culturais e Bibliotecas, criando presença para além da sala de ensaio habitual.
Estar em espaços culturais distintos dentro do mesmo território expandido – bibliotecas, centros culturais, casas abertas – foi uma escolha metodológica e política. Cada deslocamento criava uma nova ambiência, revelava outras potências, instaurava encontros.
A seguir, excertos em vídeo mostram trechos das oficinas entre 2022 e 2025, sem cortes, para que conheçam a atmosfera de cada território e coletivo:
SÃO PAULO | Centro Cultural da Penha — 2022



SÃO PAULO | Biblioteca Pública Cassiano Ricardo — 2023 e 2024







CURITIBA | Casa Eliseu Voronkoff — 2025







Experiência Formadora do Projeto: lembrança de onde começou a nascer a oficina

Uma memória em um território: Foi nesse lugar que percebi a importância de trabalhar o corpo e a relação com o espaço. Para facilitar as dinâmicas de memória, eu precisava primeiro trabalhar o pertencimento àquele lugar e, para isso, exercícios de aquecimento com Viewpoints foram essenciais.

"O território não é apenas o conjunto dos sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como o território usado, não o território em si. O território usado é o chão mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho, o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida."
Viewpoints e Composição
Uma das mais relevantes bases criativas da oficina
Para chegar a esse trabalho coletivo, é essencial dar espaço ao trabalho com Viewpoints e Composição. Uma descoberta de um caminho potente de criação e escuta coletiva.
Essas práticas se incorporaram naturalmente à rotina dos encontros desde a primeira rodada da oficina – presentes nos aquecimentos, nos jogos com o espaço e, principalmente, nas “cheganças” a cada novo ambiente.
Mais do que técnica, Viewpoints virou linguagem de pertencimento a um território e de criação compartilhada.
“Viewpoints são uma série de nomes dados a certos princípios de movimento através do tempo e do espaço; esses nomes constituem uma linguagem para falar sobre o que acontece no palco.”
Desenvolvidas a partir dos Six Viewpoints de Mary Overlie (1970), e sistematizadas por Bogart e Landau, essas ferramentas estimulam a criação teatral a partir do corpo, da escuta e da improvisação. Elas rompem com hierarquias tradicionais e fortalecem o coletivo.
Durante minha formação, aprendi os nove Viewpoints físicos, divididos entre os eixos de Tempo e Espaço:

Bloco sobre Tempo e Espaço
Tempo
Andamento
A medida da velocidade na qual um movimento acontece.
Duração
Quanto dura um movimento ou sequência de movimentos.
Resposta Cinestésica
Reação impulsiva ao movimento externo, no tempo do agora.
Repetição
Repetição de movimentos internos ou externos (formas, gestos, ritmos).
Espaço
Forma
O desenho que o corpo cria no espaço.
Gesto
Movimento com começo, meio e fim. Pode ser: Comportamental (realista) ou Expressivo (poético, simbólico).
Arquitetura
Como o corpo se relaciona com o espaço físico — sua massa, textura, luz, cor, som.
Relação Espacial
Distâncias entre corpos, entre grupos ou com o espaço arquitetônico.
Topografia
Os caminhos que o corpo traça no chão, o padrão da movimentação.
Sobre o conceito de Composição
E a Composição?
Composição é uma forma de pensar e organizar a criação cênica. É liberdade com escuta. Impulso com intenção.
Segundo Bogart e Landau, Composição é:
- Um método para gerar e desenvolver vocabulário teatral.
- Um processo para acessar pensamentos e sentimentos escondidos.
- Um campo de diálogo com outras linguagens (música, pintura, fotografia).
- Uma prática para quem cria — seja diretor, ator, performer ou designer.
Encerramento e reflexão final
Essas ferramentas foram adaptadas com escuta ao contexto territorial e às vivências e corpos das pessoas participantes.
A escolha pelo uso de Viewpoints como coluna vertebral de todos os encontros ajudou a criar um ambiente acessível, intuitivo e sensível, facilitando a integração das pessoas para que, nos exercícios de memória, se tornasse mais fácil e menos racional o compartilhamento de histórias.
No território do Museu Autobiográfico, é proposto um lugar onde novos corpos, gestos e histórias podem se desenvolver a partir do chão em que estão. Ao mover o corpo em um espaço, move-se também os pensamentos criativos que se unem, criando um coletivo com maior senso de pertencimento e confiança em contar a própria história.